Terapia com Estrogênio Vaginal e Sobrevivência em Mulheres com Câncer de Mama

Atualizado em 07/11/2023

INTRODUÇÃO


Muitas mulheres sobreviventes do câncer de mama podem apresentar sintomas da síndrome geniturinária, como coceira vaginal, queimação, dor durante a relação sexual e incontinência urinária. A terapia com estrogênio vaginal é um tratamento eficaz para a síndrome geniturinária, porém estudos demonstraram um aumento na recorrência em pacientes com câncer de mama que receberam terapia de reposição hormonal sistêmica e um pequeno aumento nos níveis de estradiol sérico com o uso de um comprimido de estradiol vaginal. Não há grandes ensaios clínicos randomizados de terapia de estrogênio vaginal em pacientes com câncer de mama com poder estatístico para investigar a recorrência ou a mortalidade. O objetivo deste estudo foi determinar se o risco de mortalidade específica por câncer de mama era maior em mulheres com câncer de mama que usavam terapia de estrogênio vaginal em comparação com aquelas que não usavam essa terapia.


MÉTODO


Foram analisadas duas coortes baseadas em bancos de dados da população da Escócia e País de Gales. O uso de medicamentos foi verificado a partir dos registros de prescrição dos médicos gerais no País de Gales ou dos registros de dispensação de farmácia na Escócia. O desfecho primário de tempo até a mortalidade específica por câncer de mama foi obtido a partir dos registros nacionais de mortalidade até junho de 2019 na Escócia e até junho de 2020 no País de Gales. A exposição foi analisada como uma variável de tempo única nas seguintes categorias: TRH sistêmica (com ou sem terapia de estrogênio vaginal), terapia de estrogênio vaginal isolada e sem TRH.


RESULTADOS


Foram analisadas 49.237 mulheres com câncer de mama (idades entre 40 e 79 anos) e 5.795 mortes específicas por câncer de mama, com um seguimento de 8 anos na coorte do País de Gales e 5 anos na coorte da Escócia. No geral, 5% das mulheres (2.551) usaram terapia de estrogênio vaginal após o diagnóstico e 1% (556) receberam TRH sistêmica.


Não houve evidência de maior mortalidade específica por câncer de mama naqueles que usaram terapia de estrogênio vaginal em comparação com aqueles que não usaram TRH. Não foram observados riscos aumentados quando avaliados tumores receptor de estrogênio positivo (RR, 0,88; IC 95%, 0,62-1,25) ou mulheres que usavam inibidores de aromatase (RR, 0,72; IC 95%, 0,58-0,91).


CONCLUSÃO


Em análise dessas duas grandes coortes atuais, não houve evidências de que a terapia de estrogênio vaginal estivesse associada a um aumento no risco de mortalidade precoce específica por câncer de mama. O resultado ratifica o estudo dinamarquês envolvendo 8.461 pacientes com câncer de mama, que não observou associação entre a terapia de estrogênio vaginal e a recorrência do câncer (RR ajustado, 1,08; IC 95%, 0,89-1,32). O estudo dinamarquês observou um aumento de 39% na recorrência em pacientes que usaram tanto a terapia de estrogênio vaginal quanto inibidores de aromatase. No atual estudo não foi analisado a recorrência, mas não observaram-se evidências de aumento na mortalidade específica por câncer de mama nesse subgrupo. Diante da falta de ensaios clínicos sobre a terapia de estrogênio vaginal em pacientes com câncer de mama, os resultados deste estudo fornecem alguma tranquilidade de que pacientes com câncer de mama que receberam terapia de estrogênio vaginal não parecem enfrentar um aumento significativo no risco de recorrência do câncer. Porém, devemos levar em consideração as limitações do estudo, que inclui a impossibilidade de confirmar a adesão à medicação, vieses quanto a variáveis mal registradas ou indisponíveis, como atividade física e status menopausal.


Esses achados podem apoiar as diretrizes que sugerem que a terapia de estrogênio vaginal deveria ser considerada em pacientes com câncer de mama e sintomas geniturinários cujos tratamentos não hormonais forem ineficazes.


Autor(a)

Paulo Tenório
Médico Mastologista pela FMUSP/SP

Mastologista do Programa Cuidar do Hospital Israelita Albert Einstein; Mastologista da Clínica Femi em Alphaville/SP; Membro da Comissão de Educação Continuada da Sociedade Brasileira de Mastologia-SP