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Atualizado em 03/06/2022
O carcinoma ductal in situ (CDIS) é diagnosticado em mais de 50.000 mulheres por ano nos EUA, primariamente através do rastreamento mamográfico. O tratamento comum para esta afecção são as cirurgias conservadoras (CMC) seguidas de radioterapia (RT), com 4 estudos randomizados prévios e metanálise demonstrando que a RT adjuvante diminui o risco de recorrência mamária ipsilateral (RMI) em 50%, aproximadamente.
Com o rastreamento amplamente divulgado, ele é frequentemente diagnosticado com tamanhos menores e baixo grau, criando uma incerteza sobre o benefício da RT neste cenário.
Esse é o primeiro estudo a avaliar o papel da RT mamária no tratamento de CDIS de menor risco após CMC, em comparação a outros estudos com critérios de elegibilidade mais amplos (CDIS maiores, de alto grau ou sintomáticos). O objetivo deste estudo é avaliar se a RT reduz RMI nesta população, para melhor guiar a escolha do tratamento.
A definição de CDIS de baixo risco incluiu: lesões pequenas, de baixo grau, assintomáticas e diagnosticadas no rastreamento mamográfico.
O desfecho primário deste estudo foi publicado com 7 anos de seguimento demonstrando que a RT reduziu consideravelmente a incidência de RMI (7,2% na observação-OBS vs 0,8% na RT). No entanto, considerando a propensão de RMI tardia e o efeito da radioterapia maior que o esperado visto no estudo, o seguimento de longo prazo foi planejado. Esta publicação traz os dados do seguimento prolongado.
Este foi um estudo de fase 3 randomizado aprovado pelas comissões de ética das instituições. Em suma, os critérios de inclusão foram: pacientes com CDIS detectado na mamografia, submetidos CMC, com margem cirúrgica ≥ 3 mm, lesão unifocal, tamanho da lesão na patologia/mamografia menor que 2,5 cm, de graus nucleares baixos ou intermediários.
Inicialmente o estudo especificava a RT como 50 Gy em 25 frações ou 50,4 Gy em 28 frações, mas em 2001 foi incluído 42,5 Gy em 16 frações. O boost no sítio tumoral não foi permitido.
O estudo também incorporou o uso do Tamoxifeno 20mg/dia em ambos os braços (NSABP-B24) e , partir de 2001, o uso do Tamoxifeno passou a ser opcional. As pacientes tiveram seguimento igual com mamografia anual e exame clínico em intervalos especificados.
Os resultados da análise estatística estão detalhados na publicação anterior. As pacientes foram randomizadas 1:1 e a estratificação foi por: idade (<50 , ≥50 ANOS), tamanho (≤1 cm , >1 cm), margens na patologia ( negativas , 3-9 mm, ≥10mm) e partir de 2001 , quando o tamoxifeno passou a ser opcional, este foi incluído na análise(uso sim ou não) e o grau nuclear( baixo, intermediário) também .
O desfecho primário foi a RMI, definida como recorrência invasiva ou in situ na mama ipsilateral demonstrada na biópsia. Os desfechos secundários incluíram: RMI invasiva, eventos na mama contralateral (EMC), sobrevida global (SG), sobrevida livre de doença (SLD), metástases à distância (MD), mastectomia subsequente (M), e toxicidade.
Entre Dezembro de 1999 e Julho de 2006, 636 mulheres de 200 instituições ao redor dos EUA e Canadá foram selecionadas, com consentimento, e randomizadas, (629 pacientes permaneceram no seguimento de longo prazo) (imagem 1).A idade média foi de 58 anos, com 76% delas na pós-menopausa no início do estudo. Tamanho médio da lesão foi de 0,6 cm, com grau nuclear 1 em 44% e 2 em 56%. Para 65% das pacientes a margem negativa era ≥1 cm. A intenção do uso do tamoxifeno foi balanceada, mas a prescrição variou entre os grupos com 58% no grupo da RT e 66% no grupo da OBS.
O seguimento médio foi de 13,9 anos, com um total de 52 RMI, 14 na RT e 38 na OBS , com 57% e 76% no mesmo quadrante da lesão anterior , respectivamente. A incidência cumulativa de RMI em 10 e 15 anos, respectivamente, foi de 1,5% e 7,1% com a RT e 9,2% e 15,1% com a OBS. Houve um total de 33 recorrências invasivas, 10 na RT e 23 na OBS. A RMI invasiva em 10 e 15 anos, respectivamente, foi de 0,4% e 5,4% na RT e 4,3% e 9,5% na OBS. A média de tempo para qualquer RMI foi de 11,5 anos RT vs 7 anos OBS.
Os resultados da análise multivariada da RMI mostraram que a RT permaneceu significante na redução de RMI (HR= 0.34, IC- 0,19-0,64, p=0.0007), assim como o uso do Tamoxifeno (HR= 0.45, IC- 0.25-0.78, p=0.0047). A idade, o tamanho e grau tumoral não foram associados a RMI.
Um total de 27 pacientes foram submetidas a mastectomia subsequente, 21 com RMI, sem diferença entre as taxas de mastectomia entre os grupos. Das 52 pacientes com RMI, 22 mantiveram CMC. Houve um total de 44 EMC, sem diferença entre os grupos. A incidência cumulativa de MD foi de 4% na OBS e 2,3% na RT. Não houve diferença significante nos braços do estudo com relação a MD, SG e SLD.
Os dados da toxicidade da RT mostraram 3 pacientes com toxicidade grau 3 tardia (dor mamária, ICC ou cardiomiopatia, e ECG anormal ), sem relatos de toxicidade graus 4 ou 5.
Foi visto que esse trial conseguiu selecionar melhor os CDIS de baixo grau, com taxas menores de RMI quando comparado à metanálise do EBCTCG , com esta mostrando RMI na OBS de 28,1% em 10 anos, comparado a 9,2% neste estudo na OBS. Também foi visto que o efeito da RT foi maior que o esperado, com HR de 0,36 vs 0,46 no EBCTCG, que incluiu grupo mais heterogêneo de CDIS, e a RMI na RT aos 10 anos de seguimento de 12,9% vs 1,5% neste estudo.
A RT mais utilizada foi o fracionamento convencional, com todas as RMI presentes nesse grupo. Nenhuma recorrência foi vista no grupo do hipofracionamento.
Esse trial também demonstrou que critérios clínicos patológicos conseguem identificar o CDIS de menor risco para recorrência após a cirurgia, questionando a real utilidade dos painéis multigênicos nesse grupo específico de CDIS de baixo risco.
Em resumo, a RT reduz significativamente a incidência de RMI e especificamente a recorrência invasiva para o CDIS de baixo risco, após a cirurgia conservadora, com resultados duradouros no seguimento de 15 anos, sendo a abordagem mais segura para reduzir a recorrência nessa população. Na decisão compartilhada sobre o tratamento fatores como: idade, expectativa de vida e desejo de fazer uso de terapias anti-estrogênicas devem ser considerados. Como os riscos de recorrência continuam a aumentar por pelo menos 15 anos, os dados apresentados apoiam a decisão de realizar a RT para as pacientes que desejam diminuir este risco e o risco de câncer invasivo a longo prazo.
Médica pela Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Ginecologista e Obstetra pelo Centro de Referência da Saúde da Mulher - Hospital Pérola Byington. Residente de Mastologia pelo Hospital Beneficência Portuguesa de São Paulo.