Vigilância por Ressonância Magnética (MRI) e Mortalidade por Câncer de Mama em Mulheres com Variações Sequenciais de BRCA1 e BRCA2

Atualizado em 12/03/2024

Jan Lubinski et al. JAMA Oncol. doi:10.1001/jamaoncol.2023.6944 Published online February 29, 2024.


Mulheres com uma variação patogênica nos gene BRCA1/2 enfrentam um risco vitalício de câncer de mama de 70%, o que resulta em recomendação de se realizar triagem anual com ressonância magnética (MRI) dos 25 ou 30 anos até cerca de 70 anos. Porém, há a necessidade de se comparar taxas de mortalidade entre mulheres com mutações BRCA1/2 que passam por vigilância por MRI com aquelas que não passam. Assim, o objetivo do então estudo foi relatar a incidência de câncer de mama a longo prazo e a mortalidade acumulada por câncer de mama de uma coorte de mulheres com mutação de BRCA1/2 que passaram ou não por vigilância por MRI; tendo como desfecho primário a sobrevida específica para câncer de mama.


Foram analisadas 17.940 mulheres com variações sequenciais de BRCA1 ou BRCA2, iniciando em 1995, em 59 centros de 11 países. Foram aplicados um questionário inicial no momento da inscrição, e um questionário de acompanhamento a cada 2 anos subsequentes para atualizar as exposições e para determinar casos de câncer e mortes. As mulheres foram perguntadas se participaram de um programa de vigilância por MRI e, em caso afirmativo, a data de seu primeiro exame de MRI, a data de seu exame de MRI mais recente e o número total de exames de MRI. Para aquelas que desenvolveram câncer de mama, foi questionado a data do exame de MRI mais recente antes ou no momento do diagnóstico do câncer de mama.


Foram incluídas 2.488 mulheres com uma variação sequencial no gene BRCA1 (n = 2.004) ou BRCA2 (n = 484). A média de idade na entrada no estudo foi de 41,2 anos; 25 mulheres eram asiáticas (1,0%), 5 eram negras (0,2%), e 2.421 eram brancas (97,3%), e 37 indivíduos eram de outra raça ou etnia (1,5%). Um total de 1.756 mulheres (71%) na coorte realizaram pelo menos 1 exame de MRI de triagem, seja no ano inicial (n = 505) ou posteriormente (n = 1.251). Das 732 mulheres no grupo sem vigilância por MRI, 636 (86,7%) relataram ter realizado pelo menos uma mamografia.


As mulheres foram acompanhadas por até 24 anos (média 9,2 anos) desde o início para cânceres de mama e morte. Houve 344 cânceres de mama (13,8%) relatados na coorte (284 invasivos, 50 carcinoma ductal in situ e 10 dados ausentes) e 92 mortes (35 por câncer de mama, 51 por outras causas e 6 dados ausentes). Entre as 1.756 mulheres que passaram por vigilância por MRI, houve 241 cânceres de mama e 14 mortes por câncer de mama. Em 5 dessas 14 mulheres, o câncer de mama foi diagnosticado no primeiro exame de MRI de triagem; em 6 dessas mulheres, mais de 1 ano havia se passado desde seu exame de MRI anterior. Entre as 732 mulheres que não passaram por vigilância por MRI, houve 103 cânceres de mama e 21 mortes por câncer de mama. Após ajuste para idade, variação sequencial de BRCA, país de residência e status de ooforectomia, o HR para mortalidade por câncer de mama associado à entrada no programa de vigilância por MRI foi de 0,23 (P = 0,001). O HR foi de 0,20 (P < 0,001) para mulheres com a variação sequencial de BRCA1 e 0,87 (P = 0,93) para mulheres com a variação sequencial de BRCA2. Além disso, o HR para mortalidade por câncer de mama para mulheres expostas à MRI, em comparação com mulheres expostas à mamografia, foi de 0,27 (P < 0,001). O HR para mortalidade por todas as causas associado à vigilância por MRI foi de 0,42 (P = 0,001).


A incidência cumulativa de câncer de mama nos 2 grupos foi semelhante e não houve diferença de HR ajustado para idade do câncer de mama, câncer de mama invasivo e carcinoma ductal in situ.


Entre as mulheres no grupo sem vigilância por MRI, o risco cumulativo de mortalidade por câncer de mama aos 20 anos do início foi de 14,9% (risco anual, 0,4%). Após o primeiro exame de MRI de triagem no grupo de vigilância por MRI, o risco cumulativo de mortalidade por câncer de mama foi de 3,2% aos 20 anos (risco anual, 0,1%). O risco cumulativo de mortalidade por câncer de mama foi de 20,5% até os 75 anos para aqueles que não passaram por vigilância por MRI e de 5,5% para aqueles que passaram por vigilância por MRI (P < 0,001).


Para as 205 mulheres (11,7%) que tiveram câncer invasivo diagnosticado no grupo de vigilância por MRI, a sobrevida de 10 anos foi de 93,8%. Para as 79 mulheres (10,8%) que tiveram câncer invasivo diagnosticado no grupo sem vigilância por MRI, a sobrevida de 10 anos foi de 86,7% (P < 0,01).


Os resultados desse estudo apoiam, assim, a recomendação de que mulheres com variações sequenciais no BRCA1 com 30 anos ou mais devem ser oferecidas vigilância por MRI. Observamos uma redução de 80% na mortalidade por câncer de mama para mulheres com variações sequenciais no BRCA1 após ingressarem em um programa de vigilância por MRI.


Devemos salientar as imitações do estudo quanto ao fato das mulheres serem acompanhadas até os 50 anos de idade; o que idealmente deveriam ser até os 75 anos para se estabelecer os riscos de câncer de mama ao longo da vida. E a maioria das participantes eram brancas e havia poucas mulheres de outras raças ou etnias. Também, os anos de exame de triagem por MRI variaram de 1997 a 2018 e podem não refletir a qualidade e avaliação de exames mais atuais. Além disso, um acompanhamento adicional em mulheres com variações sequenciais no BRCA2 é necessário para determinar se essas pacientes obtêm os mesmos benefícios associados à vigilância por MRI.

Autor(a)

Paulo Tenório
Médico Mastologista pela FMUSP/SP

Mastologista do Programa Cuidar do Hospital Israelita Albert Einstein; Mastologista da Clínica Femi em Alphaville/SP; Membro da Comissão de Educação Continuada da Sociedade Brasileira de Mastologia-SP