Terapia de reposição hormonal em pacientes com mutação BRCA: como não causar danos?

Atualizado em 29/08/2023

Artigo de revisão, publicado no início de 2023 por Vera Loizzi e colaboradores. Os autores começam lembrando que mulheres com mutação BRCA têm entre 17 e 44% de risco de desenvolver câncer de ovário e 65 a 72% de risco de câncer de mama e que a cirurgia profilática pode reduzir até 96% o risco de câncer de ovário e até 50% o risco de câncer de mama. Em ambos os casos, a redução de risco é mais evidente em BRCA1.


O NCCN recomenda a salpingooforectomia redutora de risco (RRSO) entre 35 e 40 anos para BRCA1 e entre 40 e 45 anos para BRCA2, ou seja, a maioria dessas mulheres será submetida a castração hormonal antes da menopausa natural, o que trará diversos sintomas a curto e a longo prazo. Os principais impactos decorrentes da menopausa cirúrgica precoce incluem desde alterações sexuais e piora na qualidade de vida até maior risco de osteoporose e doença cardiovascular. Mais de 80% das mulheres vão referir fogachos, até 50% delas vão apresentar queda da libido e ressecamento vaginal e 17 a 42% vão apresentar dor na relação sexual.


Devido ao risco aumentado de câncer de mama em mulheres com mutação de BRCA, o papel da reposição hormonal nessa população ainda é controverso. Baseado nos dados disponíveis até o momento, parece não haver aumento de risco em realizar terapia hormonal nas pacientes pré-menopausadas submetidas a RRSO. Em uma metanálise de três estudos publicada em 2018, foi observado que o impacto da terapia hormonal no risco de desenvolver câncer de mama em mulheres com mutação BRCA foi o mesmo da população não mutada. Em análise de subgrupo, observaram ainda uma tendência a redução de risco nas mulheres que usaram estrogênio isolado.


Com a publicação recente de estudos mostrando aumento de risco de carcinoma endometrial em mulheres com mutação BRCA1, associado ao aumento de risco de neoplasia endometrial em paciente usando terapia combinada, sugere-se a discussão de riscos e benefícios em associar a histerectomia no momento da RRSO. Com relação a mutação BRCA2, há menos dados disponíveis e a reposição hormonal parece ser menos arriscada devido a idade mais tardia recomendada para realizar as cirurgias redutoras de risco, mas ainda assim deve ser realizada com cuidado.


No processo de tomada de decisão, pacientes com mutação BRCA1, deveriam ser orientadas do baixo risco de realizar reposição hormonal por um curto período após a salpingooforectomia profilática, e que para aquelas submetidas a histerectomia, a reposição com estrogênio isolado parece ser a opção mais segura. Por fim, é importante salientar que a terapia de reposição hormonal é o único tratamento realmente eficaz para controle dos sintomas decorrentes da menopausa precoce induzida pela cirurgia.


Vale ressaltar que a reposição hormonal deve sempre ser associada a adoção de um estilo de vida que inclua a prática regular de exercícios físicos, dieta balanceada e suspensão do tabagismo. E que não há contraindicação absoluta para uso de contracepção hormonal ou mesmo reposição hormonal na pós menopausa para está população com mutação BRCA.

Autor(a)

Leonardo Fleury Orlandini

Doutor pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP) Ribeirão Preto; Mastologista na Rede Brasil de Oncologia- Santa Casa de Ourinhos; Membro da Comissão de Educação Continuada da SBM-SP.