Consumo Dietético de Isoflavonas e Prognóstico do Câncer de Mama: Uma Análise Prospectiva e Meta-Análise

Atualizado em 24/11/2023

Isoflavonas, encontradas principalmente na soja, são compostos derivados de plantas com uma estrutura semelhante ao estradiol. As isoflavonas podem atuar como moduladores seletivos do receptor de estrogênio (ER) com atividades tanto estrogênicas quanto antiestrogênicas. Uma associação inversa entre o consumo dietético de isoflavonas e o prognóstico do câncer de mama foi relatada em alguns estudos de coorte; enquanto que em estudos epidemiológicos não foram demonstrados esses efeitos adversos. Assim, são necessárias evidências adicionais para se obter uma compreensão melhor do papel das isoflavonas no prognóstico do câncer de mama entre diferentes populações e subtipos tumorais.


Neste estudo prospectivo, 597 sobreviventes de câncer de mama na Coreia foram recrutadas entre 2012 e 2017 e completaram uma avaliação dietética e um questionário estruturado. A ingestão total de isoflavonas (mg/dia) foi estimada usando o banco de dados de flavonoides de alimentos coreanos comuns, e a ingestão de proteínas provenientes de alimentos de soja (g/dia) e a média da ingestão diária de nutrientes foram estimadas usando o banco de dados de nutrientes da Korean Nutrition Society e a Rural Development Administration of Korea. O desfecho primário foi o risco de recorrência, definido como qualquer recorrência ipsilateral, contralateral, local, regional ou a distância e um segundo tumor.


Foi realizado também uma metanálise nas bases de dados PUBMED e EMBASE envolvendo estudos de coorte (prospectivos ou retrospectivos), mulheres com câncer de mama, estudos de associações entre consumo dietético de soja (alimentos, proteína) ou isoflavonas e o risco de recorrência de câncer de mama, mortalidade específica por câncer de mama ou mortalidade por todas as causas.


Resultados do Estudo Prospectivo


Com uma média etária de 51 anos, as médias diárias de isoflavona, proteína de soja e alimentos de soja foram de 22,83 mg/dia, 7,93 g/dia e 76,22 g/dia, respectivamente. Em um acompanhamento médio de 4,3 anos, foram identificadas 47 recorrências. Em geral, não foi observada associação significativa entre ingestão de soja ou isoflavona e o risco de recorrência entre sobreviventes de câncer de mama coreanas. Os HRs para isoflavona, proteína de soja e alimentos de soja foram 1,29 (0,60–2,78), 0,87 (0,40–1,89) e 1,03 (0,48–2,19), respectivamente. Cada incremento de 10 mg/dia na ingestão de isoflavona não foi associado à recorrência (HR: 0,97, IC de 95%: 0,82–1,15). Os HRs para cada incremento de 5 g/dia e 10 g/dia em proteína de soja e alimentos de soja foram 0,89 (0,67–1,17) e 0,99 (0,94–1,05), respectivamente. Resultados semelhantes foram encontrados em mulheres com câncer de mama luminal ou status pós-menopausa.



Resultados da Meta-Análise


Quinze estudos (14 da literatura e o presente estudo) foram incluídos nesta meta-análise. Um estudo com 339 sobreviventes não observou associação significativa entre ingestão de isoflavonas pré-diagnóstico e recorrência de câncer de mama. Outro estudo chinês, uma associação inversa foi observada entre ingestão de isoflavonas de soja e recorrência de câncer de mama em mulheres pós-menopausadas, mas não em mulheres pré-menopausadas. Uma análise conjunta de mulheres dos EUA e da China revelou uma associação inversa significativa entre ingestão dietética de isoflavonas e recorrência de câncer de mama. A ingestão dietética de isoflavonas não foi claramente associada à mortalidade específica por câncer de mama em estudos anteriores. No entanto, em três estudos de coorte, uma redução significativa no risco foi observada na categoria moderada de ingestão de isoflavonas. Uma associação inversa significativa ou nenhuma associação foi relatada entre ingestão de isoflavonas e mortalidade por todas as causas. Dois estudos de coorte mostraram uma redução significativa no risco de mortalidade por todas as causas na categoria moderada de ingestão de isoflavonas.


Em geral, uma maior ingestão de isoflavonas foi associada a um menor risco de recorrência e mortalidade por todas as causas.


Não houve associações significativas entre ingestão de isoflavonas e risco de mortalidade específica por câncer de mama, seja na meta-análise categórica ou de dose-resposta. Para a ingestão de alimentos de soja, nenhuma associação significativa foi observada com recorrência tumoral ou mortalidade por todas as causas.


Não houve diferenças significativas nos subgrupos quanto ao momento da avaliação dietética, status menopausal, status de ER ou fontes de isoflavonas. Embora o teste de diferença não tenha atingido o nível de significância estatística, a associação inversa entre ingestão de isoflavonas e recorrência foi mais pronunciada em mulheres pós-menopausadas (HR combinado: 0,71, IC de 95% 0,60–0,85) do que em mulheres pré-menopausadas (valor P para diferenças de subgrupo = 0,08).



Conclusão


Na meta-análise conjunta com o estudo atual, encontrou-se uma associação inversa entre a ingestão de isoflavonas e a recorrência entre sobreviventes de câncer de mama. Um risco significativamente menor de mortalidade por todas as causas foi observado com uma alta ingestão de isoflavonas. Quando limitada a mulheres com câncer de mama luminal ou mulheres pós-menopausadas, não foram observadas associações adversas. Importante destacar nesse estudo que o pequeno número de desfechos, em parte devido à grande proporção de pacientes em estágio inicial, um acompanhamento mais curto e um tamanho de amostra pequeno, podem ter limitado a capacidade de detectar uma associação.


Porém, esses resultados sugerem benefícios potenciais da soja e das isoflavonas em sobreviventes de câncer de mama e justificam, assim, estudos adicionais em diferentes populações para tirarmos conclusões gerais e se confirmar o real papel da ingestão dietética de soja e isoflavonas em pacientes sobreviventes ao câncer de mama.


Autor(a)

Paulo Tenório
Médico Mastologista pela FMUSP/SP

Mastologista do Programa Cuidar do Hospital Israelita Albert Einstein; Mastologista da Clínica Femi em Alphaville/SP; Membro da Comissão de Educação Continuada da Sociedade Brasileira de Mastologia-SP